A Palestina de Tony Blair
A Palestina de Tony Blair
Pakistan’s Mass Deportation of Afghans Poses Risks to Regional Stability
Pakistan’s Mass Deportation of Afghans Poses Risks to Regional Stability
Op-Ed / Asia 3 minutes

A Palestina de Tony Blair

O ex-primeiro-ministro britânico Tony Blair tem muitos qualidades, entre eles grande charme. Ele necessitará de todas elas para abordar o estonteante leque de tarefas mundiais que assumiu desde que foi ejetado de seu gabinete por seu taciturno sucessor, Gordon Brown. A missão diária inicial de Blair, após deixar de governar o Reino Unido, foi levar paz ao Oriente Médio, ajudando a estabelecer as instituições governamentais de um Estado palestino.

A partir de então, Blair tornou-se assessor de bancos (que atualmente necessitam toda assessoria que puderem obter), viaja pelo mundo para incentivar uma política sensata de enfrentamento do aquecimento mundial e das mudanças climáticas, criou uma fundação para ajudar a transpor o fosso entre diferentes fés e pronunciará uma conferência sobre religião em Yale. Falta apenas resgatar a sorte das seleções nacionais inglesas de futebol e críquete. Talvez ele possa dar conta disso nos fins de semana.

Mas Blair fez recentemente um comentário proveitoso sobre a Palestina e Israel que merece ser levado a sério. Durante os longos anos dessa tragédia sangrenta, tentamos avançar minimamente rumo a um acordo baseando-nos em medidas para construir confiança mútua, no caso do "Roteiro para a Paz" - há muito extinto -, tentando obrigar ambas as partes a dar passos simultâneos em direção a um acordo. Alguns observadores, inclusive obstinados israelenses ativistas pela paz, sugeriram uma abordagem diferente.

Você nunca terá sucesso, dizem eles, se tentar avançar lentamente, e por tentativas, rumo ao fim de jogo. Em vez disso, deveria pular diretamente para o acordo final. E como você não conseguirá que as duas partes concordem, será preciso impô-lo de fora.

Porém, é mais fácil descrever esse desfecho ambicioso do que realizá-lo. Embora a opinião pública israelense de modo geral pareça mais avançada do que a de seus líderes políticos na abordagem à paz, é difícil ver com alguém poderia se impor aos israelenses. Eles precisam ser pressionados e impelidos a uma negociação bem-sucedida.

O que significaria tratar imediatamente da criação do Estado palestino?

Presumivelmente, Blair não está propondo aos palestinos a criação de um Estado antes de que seja alcançado um acordo sobre fronteiras definitivas. Não pode haver um Estado palestino sem enfrentar a questão dos assentamentos na Cisjordânia. Se o leitor não acredita em mim, basta visitar a Cisjordânia e ver, por exemplo, como o desenvolvimento suburbano proposto pelos israelenses para Jerusalém Oriental atravessa o coração do território palestino rumo ao Mar Morto. Como é possível ter um Estado viável incrustado por barreiras, vias militares e arame farpado?

Um Estado palestino deveria estar contido nas fronteiras de 1967 (ajustadas mediante negociações). Ativistas pela paz nos dois campos solucionaram essa questão na iniciativa de Genebra. Yasser Arafat e Ehud Barak chegaram perto de fazê-lo em Camp David, quase oito anos atrás.

Além disso, um Estado palestino não apenas compreenderia a Cisjordânia e a Faixa de Gaza, como também, presumivelmente, teria de acomodar os principais partidos políticos em cada uma das duas áreas. As tentativas de destruir o Hamas - seja política ou fisicamente - não funcionaram e não funcionarão. Os americanos e europeus cometeram um grande erro ao conspirarem para destruir o governo de unidade nacional Fatah-Hamas, criado em larga medida graças à diplomacia da Arábia Saudita e de outros países da Liga Árabe.

Espero que Blair esteja dizendo isso a seus amigos americanos. O maior êxito de Blair foi o acordo de paz na Irlanda do Norte. Esse triunfo histórico dependeu de trazer para as negociações os políticos do Sinn Fein - líderes do Movimento Irlandês Republicano -, que em muitos casos não poderiam ser distinguidos do IRA, que praticou atentados a bomba, fuzilou e aleijou civis em busca de seus objetivos políticos.

Por que deveria o que deu certo na Irlanda do Norte - na realidade, o que os EUA pressionaram o Reino Unido a fazer - ser impensável no Oriente Médio? Somos nós, no Ocidente, culpados de usar dois pesos e duas medidas, mais uma vez?

Eu abomino todo e qualquer ato terrorista, seja praticado pelo Hamas ou por quem for. Tive amigos mortos por terroristas. Mas desde quando sentimentos e denúncias morais passaram a ser ingredientes suficientes para formulação de políticas? E quando foi que reações militares desproporcionais ao terrorismo foram produtivas?

O terceiro desafio ao estabelecimento de um Estado palestino é criar as instituições características de um Estado: hospitais, portos, aeroportos, rodovias, tribunais, postos policiais, agência tributária e arquivos governamentais. Quando fui Comissário Europeu, encaminhamos recursos oriundos dos contribuintes europeus para cobrir os custos da montagem dessas instituições. Então vimos isso tudo sistematicamente arrasado pela reação israelense à segunda Intifada.

Em que medida a destruição das carteiras de motorista na Palestina preservaram a segurança israelense? O que se conseguiu de segurança destruindo caminhos usados por palestinos, erradicando oliveiras e contaminando poços?

Um Estado palestino necessitará ser construído de baixo para cima. E o que for construído não deveria ser destruído.

Desejo ver - e estou certo de que Blair também quer - um Estado palestino pacífico vizinho de um Estado de Israel seguro numa região unida em prosperidade e estabilidade. Talvez Blair tenha enxergado como isso pode ser obtido. Mas ele deve ponderar as implicações de tal abordagem em meio a suas reuniões em conselhos de administração, conferências e oportunidades para fotos.

Subscribe to Crisis Group’s Email Updates

Receive the best source of conflict analysis right in your inbox.