Estabilidade dos Balcãs pode ficar em mãos portuguesas
Estabilidade dos Balcãs pode ficar em mãos portuguesas
What’s Left of Sudan After a Year At War?
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Op-Ed / Africa 3 minutes

Estabilidade dos Balcãs pode ficar em mãos portuguesas

É provável que a presidência portuguesa da União Europeia - que começa a 1 de Julho - tenha de gerir a espinhosa questão do estatuto final do Kosovo. Se, no princípio do ano de 2007, se esperava que o projecto do enviado especial das Nações Unidas, Martti Ahtisaari, fosse apresentado depressa e reunisse consenso, este optimismo já desapareceu. Sem dúvida que a presidência alemã passará esta questão aos portugueses.

O enviado teve de adiar várias vezes a apresentação do seu projecto por razões de política interna sérvia. Primeiro, não quis interferir com as eleições sérvias; depois tentou não desestabilizar o delicado processo de formação do Governo.

Nesta situação delicada, a Rússia começou a ameaçar com o seu veto no Conselho de Segurança, caso não tenham lugar mais negociações entre Belgrado e Pristina. Martti Ahtisaari reuniu em Viena o presidente Tadic e o primeiro-ministro Kostunica da Sérvia com o presidente Sedju e o primeiro-ministro Ceku do Kosovo, para mais duas semanas de negociações que terminaram há dez dias sem resultados.

No Kosovo, o grau de impaciência cresce a cada semana que passa sem um calendário preciso com datas claras para a resolução do estatuto final da região. O facto de não terem um Estado impede os kosovares de viajarem livremente (os documentos de identidade fornecidos pela ONU não têm um bom nível de reconhecimento). Para uma região que sempre "produziu" emigrantes, esta situação faz-se sentir de uma maneira muito cruel no campo económico. Torna-se também muito difícil, para não dizer quase impossível, atrair investimento num protectorado da ONU, onde não se sabe que tipo de novas leis vão regular o comércio, os impostos ou o direito de propriedade. O resultado, para o Kosovo, é o nível de desemprego mais alto da Europa. Pedir mais paciência em tais condições não será suficiente para manter a calma.

Se não se oferecer uma perspectiva de resolução do estatuto final nos próximos meses, será cada vez mais difícil para o presidente e para o primeiro-ministro do Kosovo manterem a população calma e confiante. Seria terrível ver novas ondas de violência no Kosovo. Será, talvez, o que esperam os sectores mais radicais da Sérvia, para assim poderem demonstrar que os kosovares não se podem governar sozinhos e que, por consequência, não têm direito a almejar a independência.

A solução ideal seria o Conselho de Segurança da ONU acordar uma resolução que, não referindo a independência, apoiasse sem mais demoras o texto de Ahtisaari. Mas a Rússia parece estar ainda longe de aceitar um texto deste tipo. E, dentro da União Europeia, nem todos os países estão de acordo sobre que conduta seguir. Espanha e Grécia, por exemplo, opõem-se à ideia de impor uma modificação de fronteiras a um país europeu que não o queira. Portugal parece estar de momento indeciso, mas quer, justamente, privilegiar uma posição europeia firme e unida.

Os paradoxos desta situação são muitos. Primeiro, embora digam o contrário em público, os políticos sérvios estão muito conscientes do preço político e económico que teriam de pagar para reintegrar o Kosovo na Sérvia. É algo que não desejam, mas também não querem ficar na história como os que perderam a província. Estão, pois, à espera de que a solução lhes seja imposta.

Segundo, as hesitações da UE apenas incitam a Rússia a perturbar o jogo no Conselho de Segurança, por sentir que poderia contar com aliados na União. Se Moscovo se apercebesse que os 27, que pagam grande parte do envolvimento actual no Kosovo, estavam firmes e unidos, ponderaria um pouco mais antes de pôr em perigo as boas relações que tem com os europeus sobre uma questão como Kosovo.

Terceiro, se Lisboa não quer fazer esforços diplomáticos para obter um consenso europeu sobre a necessidade de reconhecer a independência do Kosovo, a presidência portuguesa da União poderá ter de encarar o cenário catastrófico de uma União Europeia dividida, face a um Kosovo declarado independente unilateralmente por não ter obtido uma resolução do Conselho de Segurança. Que faria então a presidência portuguesa? Esta divisão seria ainda pior do que o que se passou em 2003 a propósito da guerra do Iraque. Em vez de esperar que esta catástrofe lhe rebente nas mãos, Lisboa faria muito melhor em utilizar já a boa imagem de que Portugal goza na Europa para obter, através de um grande esforço diplomático, um consenso sobre o caminho a seguir quando o Kosovo declarar a sua independência.

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